As saudades têm esta característica: apertam o coração quando são muitas. Começam a nascer no peito como vinha plantada na terra. Primeiro invisível e tímida, depois perde a vergonha numa explosão que só termina quando desabrocha rumo ao céu. Assim são as vinhas e as saudades. E que saudades tive eu da vossa companhia, deste nosso espaço onde semanalmente nos encontramos para falar de vinho e vida.

 

Férias e sopas de cavalo cansado.

 

Passaram a correr e terminaram com a tristeza de quem vê o fundo do copo a um bom vinho. O verão este ano foi VERÃO, as praias estiveram amenas e seguras, consegui saborear o melhor que temos dentro das nossas fronteiras e acompanhei as notícias. Assisti com alguma perplexidade ao direto do salvamento presidencial e acompanhei as novidades da pandemia, da política, da economia e do futebol. Se o surto pandémico continua a não dar tréguas à população e à economia já no campo político as coisas andam mornas por enquanto. Só as presidenciais ameaçam trazer um verdadeiro terramoto de argumentos, agressões e ofensas. Preparem-se para assistir aos conflitos e temas cozinhados ao ritmo da necessidade. O futebol, por último mas não menos mediático, continua a ser o futebol. Compra, venda, empréstimo, suspense, Cavani que diziam que vinha mas que nunca chegou. Enfim, novelas da vida real que seguem o argumento de alguém que escreve meticulosamente o próximo capítulo. E nós a assistir. A permitir que alguém manipule os cordões da nossa atenção.

 

Afinal tudo na mesma.

 

Verdade. Passaram algumas semanas e contínua tudo igual. No mesmo impasse, na mesma rotina e no marasmo habitual de um Setembro desconfiado.

Resta-nos pensar que estamos num mês importantíssimo para o vinho. Período de vindimas, de promessas e esperança. Muita esperança que o líquido maravilhoso seja criado pela generosidade divida dos nossos produtores. Com o cuidado único e apaixonado que só eles conseguem ter.

 

Ainda sobre o verão

 

Dediquei-me a conhecer os vinhos brancos. Não pela marca ou pela região mas pela casta. Compreendi que num dedo de vinho deitado num copo é possível reconhecer a gentileza do fruto, os aromas da pipa, as notas e a poesia. Aprendi ultimamente que quanto a vinho ninguém é estático, ou seja, dizer “eu só gosto de” é um erro de principiante porque o gosto evolui a um ritmo alucinante. Devemos antes dizer “eu nesta fase prefiro”. A velha máxima “nunca digas desta água não beberei” aplica-se definitivamente ao vinho. Assim nesta minha fase estou apaixonadíssimo pelos brancos monocasta, sauvignon blanc, meu Deus, deliciosos e frutados. Requinte e leveza. Música, poesia, arte e memória. Lembranças de um passado que avivam a vontade de viver o futuro.

 

Sobre o inverno

 

Gosto de fazer exercícios sobre o futuro. Imaginar o que vem por lá. O depois. E o que nos espera? Um bom ano de vinho? Viagens e passeios ou confinamento munidos de máscaras e gel desinfetante? Amigos e convívio ou ecrãs e videoconferências? Honestamente estou convencido que o país vai ferver com as presidências, que a pandemia vai desacelerar e a economia vai voltar a andar. A minha previsão é que lá pelo natal já devemos ter um sentimento diferente. Se assim for nada está perdido, se for ao contrário também penso que há alguma esperança. Tramado é se a colheita não corre bem e o vinho não é bom. Isso é que é mau sinal porque um país sem vinho bom é uma nação com mais problemas ainda.

 

#tristaodeandrade