Branco, tinto, rosé ou saudade.
Existem várias qualidades de vinho e muitas maneiras de o produzir. Hoje em dia aproveitamos as técnicas do passado que o tempo trouxe até aos nossos dias e a tecnologia moderna capaz de realizar o impensável. Uva branca que faz tintos, tintos que são a base de brancos. Experimentamos, provamos e obtemos resultados. Misturamos o antes, o agora e o depois. Os vinhos há muito que deixaram de ser só vinhos e passaram a ser o resultado artístico de um punhado de homens de grandeza maior.
A vida está ao alcance da vontade e na dependência do sonho.
Olhamos para o futuro e nele guardamos a esperança. Olhamos para o que lá foi e sentimos a saudade de uma criança com memórias da escola primária. As sopas de cavalo, o pinhal com cheiro a pinheiro e a terra molhada na planta dos nossos pés. O verão que era quente, o inverno chuvoso, o outono de folhas a cair e a primavera carregada de vida. O universo arrumado como vinho acondicionado nas prateleiras de uma garrafeira.
Os desafios
Decidimos diariamente o nosso rumo articulando a nossa vontade, com o nosso desejo, a possibilidade e as intenções de quem nos rodeia. Os sonhos. Os nossos e aqueles de quem amamos.
Uma balança de equilíbrio, um malabarista experiente em construir um castelo de cartas. O eterno desafio de chegar ao final do dia com a ideia de missão cumprida. A arte de ser amado, respeitado, acarinhado e compreendido. No fundo a solução para dar ao espirito humano a paz que o deixa viver sem tumultos. As dificuldades do dia-a-dia, a uva que se estraga, o chão que seca sem a contribuição da natureza. As chuvas que são lágrimas de dor na falta, de alegria da queda em tempo de escassez e de nova dor quando tomba em excesso. As mãos vazias no fim de uma colheita falhada, um ano mau que ameaça chegar. A frustração. A desilusão do caminho. A queda, o levantar, voltar a cair e tornar a tombar. O vinho mal envelhecido, a pipa que cai ao chão e tudo estragado.
A sensação de estar tudo errado. Às vezes seria mais fácil desistir, virar o volante e seguir novo rumo. Deixar textos por terminar, colheitas por fazer, uvas por vindimar. Verdade. Seria mais fácil e menos incomodativo. Entregar ao universo a responsabilidade da vindima, permitir que o próprio tempo fizesse o fruto cair ao chão sem a mão humana para o colher porque se o homem não o fizer o tempo irá fazer.
Às vezes é só a saudade que nos faz ficar parados no meio da multidão a sentir a solidão. A questionar a razão que nos leva hoje a ser um, amanhã outro e depois outro ainda. A questionar o porquê de branco, tinto ou rosé. À procura de respostas que, sem saber porquê, nunca chegam. Desafios que o universo nos envia. Em nós a saudade de um tempo que já na volta porque hoje somos o chão, amanhã a uva e por fim o vinho. Branco, tinto ou rosé? Isso já depende de cada um.
Tristão de Andrade