OLHAR SOBRE ABRANTES
História
Desconhece-se a origem e significado do nome Abrantes, havendo contudo várias lendas sobre a sua etimologia.
A primeira prova documental da existência do núcleo populacional de Abrantes, data de 1155, porém, existem vestígios de ocupação romana e árabe nas margens do Tejo.
Na documentação do século XII, o topónimo Ablantes, era o mais referenciado. Supõe-se que a fundação de Abrantes, tenha ocorrido em meados do século XII, seguindo o modelo dos chamados “Concelhos Perfeitos”, resultado da necessidade de defesa dos territórios conquistados, por D. Afonso Henriques e de assegurar a vida activa de Santarém.
Para melhor salvaguardar a defesa deste povoamento, em 1173, D. Afonso Henriques, doou o Castelo de Abrantes e o seu extenso termo, à Ordem de S. Tiago de Espada. Seis anos mais tarde, concedeu-lhe o seu primeiro Foral (1179), que viria a ser reformulado por D. Manuel I, a 10 de Abril de 1518.
A história de Abrantes cruzou-se por diversas vezes com a monarquia, destacando-se os seguintes episódios históricos: foi de Abrantes, que D. João I (mestre de Avis), partiu para a Batalha de Aljubarrota, em 1385; no início do século XVI (1506 e 1507), aqui nasceram os Infantes D. Luís e D. Fernando, filhos de D. Manuel I, no antigo Paço Real (D. Manuel terá permanecido em Abrantes durante aproximadamente 20 anos, refugiando-se da peste que se fazia sentir em Lisboa); em 1641, depois de Lisboa, o povo de Abrantes foi o primeiro a aclamar D. João IV como rei, pelo que como prova de gratidão, este rei intitulou Abrantes de “Notável Vila de Abrantes” e consequentemente, consagrou a sua separação da Comarca de Tomar.
Contudo, a importância que os sucessivos reis deram a Abrantes foi um pouco mais além, constando esta nos dotes de casamento de várias rainhas, das quais: D. Mécia Lopes Haro (1240 / 1243), D. Isabel (1281) e D. Leonor Teles (1372).
Em 1771, o comércio fluvial constituía uma actividade de peso na região, assim se mantendo, até inícios do século XIX. Localizada na confluência de três províncias, Abrantes tinha ao seu dispor uma vital via de desenvolvimento – o Rio Tejo, que lhe possibilitou uma diversificada actividade comercial com Santarém, Lisboa e ainda trocas directas com o estrangeiro. A localização geográfica de Abrantes, conferiu-lhe um acrescido interesse estratégico.
A 23 de Novembro de 1807, Abrantes foi ocupada pelas tropas francesas comandadas pelo General Junot.
Abrantes ascendeu à categoria de Cidade, em 14 de Junho de 1916.
Lenda de Abrantes
“Abrantes é uma antiquíssima cidade. Segundo alguns autores, terá sido fundada pelos Túrdulos 990 anos antes de Cristo, segundo outros foi fundada por galo-celtas em 308 a.C. Foi senhoreada por Romanos, Visigodos, Árabes e, por fim, em 8 de Dezembro de 1148, conquistou-a D. Afonso Henriques. Diz-se que os Romanos lhe chamavam Tubucci, os Visigodos Aurantes e os Árabes Líbia. Segundo a lenda, o nome de Abrantes data, mais ou menos, da época da conquista da fortaleza por D. Afonso Henriques, estando ligado a acontecimentos imediatamente posteriores.
Consta que era alcaide do castelo um velho mouro chamado Abraham Zaid. Abraham tinha uma filha a que chamara Zara e um filho bastardo, de uma cativa cristã, a que pusera o nome de Samuel. Ninguém sabia, porém, que Samuel era filho do velho alcaide, nem o próprio rapaz. Assim, viviam os dois jovens apaixonados e o velho sentindo crescer em si, dia a dia, uma angústia terrível, antevendo a hora em que seria obrigado a revelar o seu segredo.
Um dia, diz a História, os cristãos foram pôr cerco ao castelo. A hoste era comandada pelo aguerrido Afonso Henriques, que trazia consigo vários cavaleiros e monges. Do Mosteiro do Lorvão trouxera o Rei um velho sábio monge beneditino para o aconselhar nos assuntos espirituais. De algures, de um local qualquer do reino, trouxera um cavaleiro cheio de ideias e de força guerreira, chamado Machado.
Ferida a batalha e conquistado o castelo, Samuel foi aprisionado por Machado. Na confusão do saque e da debandada moura, o cavaleiro, que acabara de desarmar Samuel, viu um peão perseguindo Zara com intuitos evidentes de violação, e, entregando o prisioneiro a dois vigias, correu em auxílio da moura. Com um forte empurrão derrubou o soldado, que estava ébrio, e amparando Zara foi entrega-la à custódia do velho beneditino, até que se acalmassem os ânimos exaltados pelo sangue, pelo saque e pelo vinho.
Quando o cavaleiro Machado retomou o seu posto, ia como que alheado. Ficara fascinado pela beleza da moura, estranhamente parecida com uma imagem de Nossa Senhora dos Aflitos que sua mãe lhe dera ao morrer e que ele, devotamente, trazia sempre consigo. Por outro lado, impressionara-o a repentina recordação de um sonho que vinha tendo frequentemente e no qual, ao escalar os muros de um castelo, se via salvando uma donzela com quem casaria. Tudo isto contribuía para o alheamento do jovem cavaleiro, que, se não fossem as suas obrigações de guerreiro, decerto se teria quedado em enternecida contemplação da bela Zara.
Entretanto, D. Afonso Henriques, querendo remunerar os serviços prestados naquela batalha pelo seu bastardo D. Pedro Afonso, deu-lhe o senhorio do castelo e nomeou-o seu alcaide-mor. Pedro Afonso, porém, desejava partir com o pai para Torres Novas e, por isso, decidiu delegar a alcaidaria no cavaleiro Machado. O Rei, antes de partir, mandou que o monge ficasse no castelo como guardião das almas, ordenou-lhe que entregasse a prisioneira a Abraham e tomou todas as medidas necessárias à segurança da vila.
Assim que a hoste se desvaneceu ao longe, na poeira, o cavaleiro Machado, feliz por ficar como alcaide do castelo, apaixonado por Zara, preparou-se para conquistar o seu coração utilizando os meios permitidos pelo código de honra da cavalaria, ou seja, os modos corteses e suaves. Mas Zara, que adorava Samuel, sentia uma espécie de rejeição cada vez que o cavaleiro se aproximava de si. E, para não fazer qualquer gesto mais brusco que comprometesse a boa paz em que viviam, pediu conselhos ao pai e ao velho monge. O frade, como confessor do cavaleiro, bem sabia o amor que ele tinha pela donzela, e, como bom observador, compreendia que nas evasivas de Abraham existia qualquer coisa de estranho. Por tudo isto, procurava conciliar toda a gente e assegurava a Zara a honradez e nobreza de sentimentos do jovem alcaide.
Samuel, porém, não conseguia viver em paz. Os ciúmes irrompiam nele à mínima alusão, ao mínimo gesto, sem que conseguisse controlar-se. E, na sua insegurança, tão depressa acatava as palavras conciliatórias de Zara, de Abraham e do monge, como ficava possuído pelo demónio da loucura, que o obrigava a cometer insânias.
Zara acreditava que Samuel estava compenetrado do seu amor e da sua fidelidade e pensava, por isso, que as acções destrambelhadas do rapaz provinham da sua mudança de situação para vencido de guerra. Assim, certa tarde em que tentava reconciliá-lo com o alcaide, perguntou ao pai como deveria proceder se o cavaleiro viesse procurá-la e ele não estivesse em casa: deveria manter a porta fechada como se não estivesse ninguém, ou recebê-lo-ia?
Abraham, julgando ver nesta pergunta um novo intuito de ofensa ao alcaide do castelo, para evitar mais problemas, respondeu: Nada temo nem receio da tua virtude, minha filha. E confio também na honradez do alcaide. Abre antes a porta!
Samuel, porém, ao ouvir estas palavras perdeu o domínio de si e correu para a rua, gritando como um louco: Abre antes! Abre antes!
A vizinhança acorreu, uns aos postigos, outros às vielas, a saber o que aquilo era, e Samuel, enlouquecido de ciúmes, contava a história à sua maneira, deixando agravados: o alcaide, Zara, Abraham e o próprio monge.
Conta a lenda, ainda, que Samuel acabou por cair de cansaço e de febre. Uma vez bom de saúde, Abraham juntou os filhos e contou-lhes a verdade sobre o nascimento do rapaz. Assim ficaram a saber que eram irmãos e que a mãe de Samuel fora uma bela cativa cristã que certo dia chegara a Tubucci chorando um noivo que deixara na sua terra, chamado João Gonçalves.
Rolaram lágrimas silenciosas pelas faces envelhecidas do frade beneditino. Ele fora esse João Gonçalves que, vendo a noiva desaparecer, crendo-a perdida para sempre, entrara para o Mosteiro do Lorvão. Pediu o monge a Abraham dados sobre essa cativa, para se certificar de que a mãe de Samuel fora a sua amada noiva. E vendo que os dados coincidiam, tomou o rapaz a seu cargo, conseguindo pô-lo ao serviço do Rei de Portugal.
Machado e Zara acabaram por casas, depois de os mouros se terem feitos cristãos, e dentro das muralhas da velha Tubucci reinou, finalmente, a harmonia.
E, segundo reza a lenda, em memória do febril acesso de loucura de Samuel, Tubucci passou a ser chamada Abrantes.”
FONTE: Câmara Municipal de Abrantes